Hoje estamos vivendo uma época em que a inteligência artificial (IA) se apresenta como promessa de progresso: agilidade e otimização de tarefas repetitivas e ganho de produtividade. Contudo, há uma pergunta que precisa ser feita: ganho de produtividade para quem? E a que custo para o trabalhador?
Bom, o uso da IA no mercado de trabalho tem se dado, na sua grande maioria, sob dois aspectos distintos:
O primeiro e mais promissor, que é o da libertação do tempo: ou seja, a automação de tarefas permite aos trabalhadores concentrarem-se em atividades cruciais, criativas, estratégicas, e lógico, humanas, e sobretudo, liberar tempo para descanso, estudo e convívio familiar.
O segundo e mais comum, e, na minha opinião, o mais perigoso, é o da ampliação do trabalho: ao invés de usar a IA para trabalhar melhor, usa-se para trabalhar mais, gerando uma nova forma de exploração, silenciosa e legitimada pela ideia de eficiência.
A equivocada cultura do desempenho e da produtividade ilimitada tem levado muitos trabalhadores a internalizar a lógica do “sempre produzindo”, usando a IA para dobrar a carga de trabalho. Não é mais o patrão quem impõe a sobrecarga e sim o próprio trabalhador que, em nome da eficiência, se torna o explorador de si mesmo.
A IA, nesse contexto, deixa de ser libertadora e se converte em um chicote digital.
A falta de senso crítico de quem usa IA no ambiente laboral traz implicações jurídicas, tais como aumento de jornada sem controle, supressão indireta de pausas e descanso, cobrança de metas desumanas, tudo sob pretexto de “eficiência” e a falta de responsabilidade social na substituição da mão de obra.
É muito preocupante a ausência de regulação específica e o apagamento do direito à desconexão, o que torna o cenário ainda mais perigoso para os direitos sociais, em especial os trabalhistas.
O Direito do Trabalho, como instrumento social e de equilíbrio entre capital e trabalho, precisa intervir, através dos nossos atores (legisladores e entidades sindicais) pela urgente regulamentação do uso ético da IA no ambiente laboral.
As entidades sindicais e operadores do direito devem atuar com protagonismo neste cenário, garantindo que os ganhos de produtividade sejam convertidos em melhoria da qualidade de vida, e não em intensificação do labor. Proteção ao direito da desconexão, afinal o trabalho não é um fim em si, mas um meio de construção da cidadania e do bem-estar. A inteligência artificial deve servir ao ser humano e não o contrário.
Se for para trabalhar menos, com mais criatividade e dignidade, que venha a IA.
Porém, se for para transformar o trabalhador em uma máquina mais rápida e mais silenciosa e produtiva, é nosso dever resistir. Como advogados, como sociedade e, acima de tudo, como humanos.
20/06/2025 às 11:02 – Por João Galamba, advogado trabalhista.